sábado, 22 de março de 2008

“Sedução, Conspiração” de Ang Lee



O filme abre com uma sessão de «Mah Jong» em Xangai, 1942.
Não é por acaso. “Se se prestar atenção, nada é trivial”, diz uma das personagens. Xangai foi uma das cidades mais misteriosas e atraentes do mundo (facto, aliás, bem presente neste livro de Eileen Chang, ponto de partida para o filme) durante cerca de 100 anos; a ela aportaram actores, escritores, artistas, até que, com a invasão japonesa dos anos 40, Xangai perdeu o brilho e teve um fim trágico. O jogo de «Mah Jong» é um jogo de paciência e atenção, um jogo feito de rituais complexos e engenho oriental.
E é neste ambiente carregado de simbologia que Mrs. Mak (na verdade, Chih-ying Chu, jovem Mata-Hari ao serviço da resistência chinesa com o objectivo de eliminar Yee) cruza olhares com Mr. Yee, chefe dos brutais serviços secretos japoneses. Pouco depois tornam-se amantes, desenvolvendo uma relação de obsessão sexual agravada pela tendência sadomasoquista de Yee e o fascínio que tudo isto tem para Chih-ying Chu. Pois eles não são apenas amantes ilícitos com propósitos escondidos, eles são personagens que – tal como em “O Segredo de Brokeback Mountain” – procuram chegar ao âmago das suas naturezas, mesmo que isso implique transgredirem os cânones da sociedade.
Criticado por ser longo, por ter cenas de sexo declarado, por parecer ter perdido o fio narrativo, “Sedução, Conspiração” conquistou o Leão de Ouro de Veneza e a admiração de milhares de espectadores em todo o mundo pela perfeição da cinematografia, a beleza gráfica do amor físico (e justiça seja feita a Ang Lee, nas cenas de nu frontal não há falsos pudores!), a riqueza dos diálogos, os desempenhos de Tony Leung Chiu Wai, Joan Chen e Wei Tang, e a tensão crescente da história. É como se se estivesse dentro de uma estufa, um langor que sufoca e anestesia a razão. A “Sedução, Conspiração” muitos reparos se poderão fazer, mas isto não se pode negar: é uma obra impressionante sobre alianças distorcidas, inocência corrompida e a busca do que de mais íntimo existe em cada um de nós. E só um grande realizador poderia fazê-lo. Sem cedências.
Maria das Mercês Pacheco

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